28 de abril de 2007

TAP/Paris - «Incultura» democrática

Com todo o respeito que me possa merecer o senhor director da TAP/Paris, não tem a sua atitude as condições mínimas de dignidade de que deve revestir-se o cargo de representante da companhia aérea portuguesa numa das capitais europeias de maior relevo. Refiro-me à acusação que a direcção da TAP em Paris promoveu nos tribunais franceses contra duas figuras da comunidade portuguesa nessa cidade, cujo único “crime” que cometeram foi o de denunciar os desmandos desse senhor director da TAP, na sequência de um processo de despedimento de uma funcionária – delegada sindical – da companhia portuguesa, decisão que acabaria por ser anulada pela hierarquia superior, certamente por tratar-se de um acto despótico.
Foi com o intuito de dar razão à Democracia que os senhores Luís Ferreira e José Guerreiro (director da publicação electrónica LUSO.FR) difundiram o comunicado visado pela acusação, onde apenas explanam um raciocínio por analogia, ao afirmarem que «Não se pode deixar passar, sem reagir, um caso sindical que recorda os velhos métodos de repressão do patronato, herdados da época da ditadura salazarista». Ora, esta afirmação, por si só, não constitui qualquer ataque à honra ou dignidade pessoais do senhor director da TAP/Paris, mas tão só um acto de liberdade de expressão e pensamento e do direito à informação, que não podem ser cerceados por qualquer tribunal democrático e, muito menos por aqueles que – derivado aos altos cargos públicos que ocupam – se acham no direito de impor aos restantes cidadãos a lei do silêncio e da conveniência. Sendo certo que, estando os jornalistas obrigados ao bom cumprimento das leis e das normas democráticas, o estão por maioria de razão os dirigentes dos organismos e empresas públicas, como é o caso do senhor director da TAP Air Portugal/Paris.
As expressões necessárias à defesa dos princípios e regras democráticas estão a coberto de justificação bastante, pelo que o pedaço de prosa do texto do comunicado que se pretende transformar em objecto de censura, constitui um elemento de opinião sobre a actuação de um responsável de uma empresa pública que cabe no quadro incensurável de um Estado de Direito Democrático. Permito-me recordar ao senhor director da TAP/Paris que, uma imprensa livre e isenta não pode tolerar com delicadeza as enormidades dos métodos e decisões de certos senhores, que esses sim são contrários às leis e ao ordenamento constitucional português. Recorde-se igualmente que o processo de licenciamento da delegada sindical da TAP/Paris foi pouco ortodoxo, impondo-se, por isso, para sua denúncia o recurso a uma linguagem firme e veemente.
Em vez de analisar o teor do comunicado difundido pelo LUSO.FR na perspectiva de que a prossecução do interesse público não pode justificar o sacrifício abusivo dos direitos dos cidadãos, a direcção da TAP/Paris preferiu censurar a crítica legítima, como forma a branquear a sua deficiente intervenção no processo de despedimento da funcionária da TAP/Paris. Não estivesse o senhor director da TAP/Paris possuído de um desejo de vingança, no sentido de sancionar aqueles que ousaram denunciar os seus dislates, teria tido, no mínimo, o discernimento necessário para interpretar correctamente o objectivo do comunicado, e aproveitado a ocasião para enfrentar publicamente a comunidade portuguesa de Paris, explicando-lhes pública e abertamente a sua posição, nomeadamente no que diz respeito ao processo rocambolesco de despedimento abusivo da funcionária da TAP/Paris. Ora, não o tendo feito, depreendemos facilmente que o representante da TAP em Paris não está à altura das suas funções, não só pela incapacidade em gerir situações de conflitualidade no interior da própria empresa mas também pela falta de habilidade em lidar com a crítica que lhe é dirigida, nomeadamente pela comunicação social comunitária.
O que emerge da queixa do senhor director da TAP/Paris é o entendimento de que os jornalistas estão obrigados a não criticar os organismos ou empresas públicas, mesmo quando os seus responsáveis agem contra o interesse público, que constitui a matriz e a essência de uma empresa de serviço público. Essa atitude é indigna e sintoma preocupante de prepotência, arrogância e autoritarismo a que urge pôr termo, porque ela afecta um pilar fundamental do Estado de Direito Democrático, que é a liberdade de expressão e comunicação. Não pode por isso compreender-se e – muito menos se pode aceitar – que o senhor director da TAP/Paris associe a nossa companhia aérea nacional a um golpe tão baixo e mesquinho, deixando-se minar pelo absoluto desrespeito do direito democrático da liberdade de imprensa. Passados mais de 30 anos da revolução de Abril, é simplesmente incrível como a incultura democrática pode ainda estar alojada ao mais alto nível das empresas públicas portuguesas.
Pelo que não é preciso dizer mais nada sobre o que é chocante, pela natureza das coisas.
Resta-me enviar um abraço de solidariedade ao editor responsável do LUSO.FR, pois o trabalho por este realizado é um contributo importante para o afastamento dos medos que outros plantam, sobretudo junto dos jovens jornalistas, instigando-os a uma prática castrada do jornalismo.
Viva a imprensa livre e democrática...